quarta-feira, 15 de outubro de 2014

Conviver bem!

Olhamos para os lados e, dia após dia, vemos tantas calamidades públicas ou privadas, que tentam tirar a esperança no ser humano já tão abalada em nossos tempos.

Alguns passos para frente e outros tantos para trás. Levamos sustos, ouvimos opiniões, ficamos pensativos, trocamos ideias, silenciamos por vezes em busca de respostas e continuamos concluindo que conviver continua sendo o grande desafio de todos os tempos.

“Trigo e joio” juntos, uma parábola ensinada por Jesus, tão atual e válida para os nossos dias; tão penosa e desafiante em suas implicações. Conviver nunca foi fácil e nunca será porque o ser humano tantas vezes é movido pela intolerância, pelo desejo de vingança, pelo desrespeito à vida, pelo comodismo, pelo egoísmo. Além disso, vivemos atropelados pelo trabalho, pela busca da sobrevivência, pelo desejo de aparecer, pela impaciência da espera, pela ilusão da vida e nos damos conta de que se torna uma luta desigual, como entre Davi e Golias. Por isso, milhares de pessoas desistem de viver e criam assim situações de desespero e de morte.

Saber viver bem com os outros, consigo mesmo e com o mundo significa saber superar os conflitos, erguer os olhos e contribuir para retomar o diálogo, ser misericordioso, semear a alegria de estar junto nesta convivência.  Significa sair dos horizontes conhecidos para ir em busca de verdadeiros encontros que tornam-se oportunidades para transformar os olhares e os gestos. Só quem se atreve a sair da superficialidade consegue chegar aos encontros fecundos.

Mesmo transitando em meio a tantas desesperanças, são muitas as pessoas cujas vidas ganham em seriedade, em profundidade, em compaixão e em alegria autêntica ao fazer esse caminho de saída de si mesmo. São muitas as pessoas que, em contato com vidas e histórias diferentes e reais, compreendem melhor suas vidas e sua responsabilidade.

A vida pede de todos nós uma atitude de abertura e de deslocamento frente ao outro, o que significa colocar-se em seu lugar, deixar-se questionar e desinstalar por ele. Nosso desafio não é fugir da realidade, mas aproximarmo-nos dela com todos os sentidos bem abertos para olhar e contemplar, escutar e acolher, percebendo no mais profundo da mesma a presença ativa do Deus que nos ama com criatividade infinita, para encontrar-nos com Ele e darmos sentido à nossa existência enquanto estivermos neste mundo.


Ir. Deuceli Kwiatkowski

domingo, 24 de agosto de 2014

Por que sofremos?

Perguntas movem o mundo. Perguntas inquietam. Perguntas ficam sem respostas.

Em cada dia, diante de inúmeras situações de dor e tristeza, de abandono e de sofrimento, de guerra e luta pelo poder, continuamos nos perguntando.

“Por que sofremos? Por que as pessoas boas sofrem? Por que coisas ruins acontecem com pessoas boas?”

“São perguntas que não servem para nada. Quem disse que a bondade pode livrar alguém da condição de limitada? A bondade não é uma bolha de proteção que tem o poder de livrar as pessoas das fatalidades, das injustiças, das calamidades da vida. Pessoas más também sofrem, coisas ruins também acontecem com elas. Todo mundo sofre. Pode ser que o sofrimento da pessoa boa fique mais evidente porque as más não costumam contar o que acontece.

Sofremos porque não podemos tudo. Sofremos porque temos um corpo que está condicionado aos limites de sua estrutura e possibilidades. Sofremos porque não somos capazes de fazer tudo sozinhos; somos dependentes dos outros. Sofremos porque não sabemos dizer não. Sofremos porque não sabemos dizer sim. Sofremos porque dissemos sim em ocasiões em que deveríamos ter dito não. Sofremos porque dissemos não em ocasiões em que deveríamos ter dito não. Sofremos porque vemos a violência ao nosso lado. Sofremos porque somos injustamente julgados, caluniados, maltratados. Enfim, sofremos por uma infinidade de coisas e não temos como mudar o fato de sermos naturalmente afetados pelos desajustes da vida.” Pe. Fábio de Melo

Se não podemos evitar o sofrimento, o que podemos fazer para aprendermos a lidar com ele?

Padre Léo, em sua doença, dizia: “Não sei por que estou doente. Mas sei para que fiquei doente. Fiquei doente para ser mais padre, mais amigo, mais filho”.

Escolhas são como sementes. O que plantamos hoje será fruto amanhã. A qualidade do fruto depende do que semeamos. Não há milagre que possa reverter o que foi semeado. Se as sementes plantadas eram de limão, não espere colher laranjas. É a regra da vida. É dura, mas é a lei!

Jesus também sofreu. Ele passou pelo sofrimento mais terrível que um ser humano poderia passar. Ele sabe da nossa dor. Ele conhece tudo. Olhemos para Ele quando a dor chegar. Não é possível conhecer Jesus, amar Jesus, seguir Jesus, sem entrar em sua lógica. É a lógica da cruz! Para muitos, uma estupidez, para outros, uma fraqueza, mas para aqueles que o amam verdadeiramente, é força e vitória.

Não percamos a fé, nem a esperança. Continuemos nossa caminhada tão cheia de lutas e desafios. Deus está conosco e nos ajuda a passar pelas estradas da dor.

Ir. Deuceli Kwiatkowski


sábado, 23 de agosto de 2014

Gestos e palavras: um casamento com a vida.

O que, de fato, toca o nosso coração? Depende. 

Há momentos em que muito mais do que pelas palavras que diariamente ouvimos, somos tocados pelos gestos de amor que chegam ao nosso coração na simplicidade, na verdade, na gratuidade e, tantas vezes, quando menos esperamos. Basta um sorriso, um olhar sem julgamentos, uma mensagem no celular, um telefonema de bom dia, um abraço fraterno para fazer alguém sentir-se amado e querido. Saber que para o outro eu existo desperta em nós sentimentos de alegria profunda e, mesmo distantes, tornamo-nos tão próximos.

Pequenos gestos de amor têm o poder incrível de aproximar pessoas, de devolver a serenidade na dor, de alegrar o dia de alguém, de curar corações magoados, de recuperar o ânimo abatido, de despertar novos gestos de amor, de trazer novamente alguém à luz. Ninguém resiste ao amor porque nascemos para amar e ser amados. Somente quem ama de verdade chega ao coração do outro porque quem ama é, acima de tudo, uma pessoa atenta, que sente, intui e percebe as consequências do que está para dizer ou fazer.

Mas em outros momentos, somos tocados pelas palavras porque a “nossa vida é um casamento com as palavras, as que dizemos a nós mesmos no silêncio do recolhimento e que nos ajudam a não perder de vista o rumo e a sempre reencontrá-lo, as que dizemos aos outros para compartilhar alguma coisa nossa e as que ouvimos dos outros, para nos conhecermos e para reunir o cansaço e a sabedoria do viver. Quando inexiste essa troca de palavras ditas e ouvidas, a vida é mutilada nas suas expressões mais vitais e espirituais”. Giuseppe Colombero

Esta é a nossa vida. Somos feitos para a comunhão. A amizade, o amor e todos os sentimentos fortes, mesmo o ódio, têm necessidade de palavras. Viver é encontrar e dialogar.

Portanto, manter viva a afetividade significa permanecer enxertados no tronco da vida e comunicar vida. Muitos a recusam intencionalmente porque a amizade é exigente e obriga a corresponder-lhe e a cultivá-la. Mas felizes são aqueles que descobrem o segredo da vida e se dispõem a vivê-lo em cada dia espalhando sementes de esperança, de paz, de gentilezas, de amor.

Lembremo-nos sempre: o essencial faz a vida valer a pena! E o essencial é amar porque quem ama é feliz.



Ir. Deuceli Kwiatkowski

sábado, 5 de julho de 2014

Um olhar teologal

Muitas vezes, o presente mais precioso é um olhar diferente!

Quantas vezes, em nossos dias tão corridos e decepcionantes, não desejamos este olhar? Apenas um olhar diferente! Um olhar bom, poderíamos dizer. Um olhar que nos acolha, que nos ame do jeito que somos ou estamos, que nos aceite em nossas fraquezas e limites, sem nos condenar. Um olhar que brote dos sentimentos mais verdadeiros e puros, um olhar que nos devolva a nós mesmos.

Mas qual é o meu jeito de olhar? Que olhar eu tenho? Um olhar econômico? Sociológico? Histórico? Filosófico? Psicológico? Como eu olho para as pessoas, para mim mesmo, para a vida?

O olhar depende dos sentimentos que temos enquanto falamos, mas muito mais do que cremos e vivemos habitualmente e que constituem o nosso estado de espírito. Cada um de nós tem um modo muito pessoal de ver e sentir a vida, as dificuldades, as pessoas, o mundo, e de reagir. O contato com a realidade daquilo que é diferente de nós produz determinadas reações que se transformam em emoções e isso nos torna únicos.

Nosso olhar será tanto mais profundo quanto mais for verdadeiro. Habituemo-nos a olhar as pessoas nos olhos; um olhar afetuoso que não intimide e não se sinta intimidado, entre iguais.

Mas qual é o olhar mais fundamental? É o olhar teologal. Olhar com o olhar de Deus! Olhar com os olhos da fé, da esperança e da caridade. Isso faz toda a diferença na forma como assumimos a realidade da vida. Deveríamos pôr-nos diante de Deus com mais frequência, deixando os olhos, os dele e os nossos, se falarem silenciosamente. Assim aprenderíamos bem essa linguagem, compreendida por todos.

Quem não compreende um olhar de amor? Quem não compreende um olhar de esperança? Quem não compreende um olhar de fé?

O primeiro testemunho, em muitos casos o único que é observado e no qual é possível acreditar, parte daqui, da qualidade de nossa humanidade.

Que nosso olhar não seja um olhar qualquer, vazio, sem palavras, mas um olhar que eleve e que reforce o convite de Jesus para buscarmos águas mais profundas. Se nosso olhar estiver fixo em Jesus, Ele passará a olhar com nossos olhos e aí será verdadeiramente um olhar teologal.


Ir. Deuceli Kwiatkowski 

sábado, 7 de junho de 2014

Amar como Jesus amou!


Olhando para Jesus, poderíamos dizer... ah, se soubéssemos amar como ele nos ensinou!  Se soubéssemos transformar nossas palavras em gestos concretos de atenção, de respeito, de perdão, de escuta porque palavras apenas não bastam mais. Estamos cansados de palavras bonitas. Cansados de palavras ocas, sem vida, sem raiz, sem convicção, sem testemunho.

Amar é uma palavra fácil de pronunciar mas tão difícil de ser praticada. Muitos nem mesmo conseguem amar a si mesmos, quanto mais as pessoas com quem convivem. Mas sem amor que sentido teria a vida? O amor se revela na forma como investimos na vida. Por isso, nossas escolhas são tão decisivas. Delas depende nossa felicidade. Importante é parar, observar a vida e aprender os segredos do Mestre do Amor.

“Ainda que eu falasse as línguas dos homens e dos anjos, e não tivesse amor, seria como o metal que soa ou como o sino que tine”. (1Cor 13,1)  

“Não existem relações perfeitas. Não existem almas gêmeas que tenham os mesmos gostos, pensamentos e opiniões iguais o tempo todo, a não ser no cinema. Decepções fazem parte do cardápio das melhores relações. Nesse cardápio, precisamos do tempero do silêncio para preparar o molho da tolerância. Para conviver com máquinas, não precisamos de silêncio nem da tolerância, mas com seres humanos elas são fundamentais”. Augusto Cury.

Não é tão fácil viver a vida porque ela contém capítulos imprevisíveis e inevitáveis, histórias mal acabadas, finais inesperados, começos sem fim. Todo ser humano passa por turbulências na vida, isso é real e compartilhado por todos. A alguns falta o pão na mesa, a outros a alegria na alma. Uns lutam pra sobreviver, outros mendigam o pão da tranquilidade e da felicidade.

Por isso, independente dos penhascos que temos que escalar, das tempestades que temos para suportar, dos desertos que temos para enfrentar, cada um possui uma força incrível. Desconhecer esta força nos impede de vencer nossos medos, de avançar em nossos projetos, de ultrapassar as barreiras.

Mas qual é o nosso maior tesouro? O que deveria ocupar o centro de nossas atenções? O carro, a casa, o trabalho, o dinheiro, as roupas, as viagens? Não! A vida! Sem ela, não temos nada e não somos nada. E sem uma vida saudável, ainda que estejamos vivos, não temos sentido, encanto, saúde e alegria de viver.



Ir. Deuceli Kwiatkowski

domingo, 27 de abril de 2014

São João Paulo II... um santo entre nós!

“Os santos são os verdadeiros portadores de luz dentro da história, porque são homens e mulheres de fé, de esperança e caridade”. Papa Bento XVI

Alguns anos já se passaram desde o dia em que ele nos deixou em lágrimas e dor. Sabemos que a vida é assim, ela simplesmente segue o seu curso normal, mas parecíamos ovelhas sem pastor, espalhados em todos os cantos do mundo, tentando encontrar um jeito de nos despedirmos daquele grande homem, cuja vocação maior era o amor pela humanidade. Como continuaríamos sem ele? Como ficaríamos sem ele?

Insondável é o Senhor que tudo sabe! Insondável é o Espírito Santo que conduz tudo! Cremos nesta verdade porque sem sua força e luz, seríamos incapazes de seguir adiante.

Nosso amado João Paulo II partiu, mas, incontestavelmente, ele continua evangelizando o mundo. Como poderíamos recordá-lo? Papa do Rosário, o Papa da Eucaristia, o Papa de Nossa Senhora de Fátima, o Papa da Consagração a Maria, o Papa impulsionador da santidade, o Papa dos movimentos leigos, o Papa da oração, o Papa peregrino, o Papa dos jovens...

Suas palavras continuam vivas! Seu testemunho de amor pelos povos, seu desejo de unidade,  sua alegria e serenidade permanecem admiravelmente no coração de milhões de jovens, crianças e adultos. Sua voz forte e suave parece ressoar em nossos ouvidos, seu sorriso sereno, seus gestos atenciosos e decididos continuam a nos tocar o coração e a alma, suas palavras, cheias de sabedoria e luz, são um tesouro disponível a todos.

Evangelização é testemunho! Quem duvidaria de seu amor por Cristo, pela Igreja, pelos povos do mundo todo? O mundo parou diante daquele que sempre foi ao encontro das pessoas porque era o servo da Palavra. Não anunciava a si mesmo. Era preciso anunciar o Evangelho a todos os povos, conduzi-los à verdade da fé, seguindo o mandato de Cristo: “Ide por todo o mundo e pregai o Evangelho a toda criatura”. (Mc 16,15)

Sua luta pelo bem da humanidade continua animando milhões de pessoas que se unem à verdade do Evangelho de Cristo! Que aqueles que formarão o mundo do futuro não se esqueçam jamais do apelo de João Paulo II, feito a eles durante a Jornada da Juventude de 2000: "Jovens de todos os continentes, não tenham medo de serem os santos do novo milênio!"

João Paulo II tornou-se um incansável construtor de um mundo melhor. Um santo entre nós! Um verdadeiro Apóstolo da paz! Vislumbramos a face de Cristo na sua face! Seu olhar contemplativo era de compaixão, suas palavras fortes e amorosas eram de um pai que cuida de seus filhos, com o olhar da misericórdia. 

Hoje exultamos de alegria pela sua canonização e agora podemos invocá-lo carinhosamente: Papa São João Paulo II, nosso querido papa da paz! Que da eternidade ele interceda por todos nós e continue evangelizando nosso coração para que sejamos fiéis seguidores de Cristo a quem ele serviu por toda a vida como discípulo forte e fiel.



Ir. Deuceli Kwiatkowski

sexta-feira, 11 de abril de 2014

Semana Santa. Um fim de semana... um amor para sempre!

É quinta-feira... Jesus sabe que é chegada a sua hora, mas Ele não parte sem antes realizar a Celebração do Amor. "Tendo amado os seus... amou-os até o fim". Quanta fidelidade existe nestas palavras! Este é o mistério da presença de um Deus que quis permanecer no caminho dos homens para nos ensinar a nos amar uns aos outros. "Tomai e comei!" Este é o mistério de um Deus que quis colocar-se em nossas mãos: eis o mistério do Amor de nosso Deus que não é para ser entendido, nem contestado, mas aceito e vivido... de joelhos!

Sexta-feira... dia do grande silêncio. O silêncio de um Deus que se deixa calar por nós porque nos ama até a loucura da cruz! "Tudo está consumado!" Diante deste mistério incompreensível só podemos permanecer em silêncio, contemplando-o com seus braços abertos, presos à cruz abraçada com a liberdade que é própria de corações divinos! Caminhemos com Ele e revivamos seu sofrimento e sua dor até o calvário. Uma cruz aceita com o mais puro amor porque sabia que devia cumprir até o final o projeto do Pai: revelar ao mundo o seu AMOR!  Nele encontramos a força para vivermos, na fé, também nossa parcela de dor na via-sacra da humanidade! É uma pequena parcela que nos aproxima dEle e nos faz mais parecidos com Ele.

Sábado... é no silêncio que Deus se revela. Aguardamos ansiosamente o dia da Ressurreição. Peçamos ao Senhor da vida a graça de continuarmos a procurá-lo também na hora da dúvida, quando o sol desaparece e quando o caminho se faz difícil.

Domingo...  é Páscoa novamente! Jesus ressuscita e nos dá a sua paz para que vivamos no amor. Ele nos deixa a certeza de que a “Terra Prometida" existe! Caminhemos nesta direção e façamos de tudo para conquistá-la com uma vida santa. “Ele nos deixou um exemplo a seguir, diz Pedro,... sigamos, portanto, seus passos!" ...eles nos conduzem pelos caminhos de uma vida eterna!

Em nós, que cremos no Cristo, começa um dia de luz... eterno, que nunca se apagará porque é a Páscoa do coração!

Que a revelação de Jesus que nos diz até que ponto Deus se dispõe a nos amar seja para nós a grande possibilidade de sairmos de nosso medo de amar e de sermos amados. É do dom gratuito de Cristo crucificado que jorra a fonte do amor. Bebamos sempre desta fonte e seremos felizes!

Que este tempo pascal nos mantenha sempre na direção do mais puro AMOR! Contemplemos agora o Cristo Vivo e vivamos com Ele e nEle!

Ir. Deuceli Kwiatkowski

Colocar o coração junto ao coração do outro

Ao longo da história sempre existiram homens e mulheres que fugiram da superficialidade das respostas fáceis e buscaram na reflexão profunda, respostas para muitos questionamentos. Foram capazes de olhar para o mundo, para si mesmas, para as pessoas de um jeito diferente tentando descobrir o essencial. Formamos um único organismo e o que toca o outro, me toca sempre. Clarice Lispector dizia: “Eu escrevo como se fosse para salvar a vida de alguém, provavelmente a minha própria vida”.

Durkheim, citando Weber, fala de um ser humano que se sente num mundo “desencantado”, onde o individualismo chegou ao extremo. Devemos ter cuidado com isso, pois é o desmoronamento da capacidade de vida coletiva que gera a crise ética. Isso ocorre quando não há concordância entre os seres humanos, visto que a expressão ‘cum cor’ é colocar o coração junto. 

Para compreendermos melhor o significado dessa expressão, relembrarei uma historinha que se aplica bem a este conceito de concordar, ou seja ‘colocar o próprio coração junto ao coração do outro’.

Um dia um Mestre perguntou aos seus discípulos:  “Por que as pessoas gritam quando estão aborrecidas? Os discípulos pensaram por alguns momentos e responderam: “Porque perdem a calma, porque se irritam”.“Mas, por que gritar quando a outra pessoa está ao seu lado, próxima a você? Não é possível falar-lhe em voz baixa?” – continuou o mestre.

Os discípulos justificaram-se respondendo que, às vezes, as pessoas ficam impacientes, ou porque não se fazem entender, ou porque estão incomodadas com algo, e então gritam para ver se o outro a compreende. Vendo que eles não chegavam ao âmago da questão, o mestre lhes explicou:

As pessoas gritam porque quando elas estão aborrecidas, seus corações se afastam. E para cobrir esta distância precisam gritar para uma escutar a outra. Quanto mais aborrecidas estiverem, mais alto e forte têm de gritar para serem ouvidas”.

Para fazer-se entender ainda mais, o mestre continuou:  O que sucede quando duas pessoas se enamoram? Elas não gritam, falam suavemente. Por quê? Porque os seus corações estão muito perto. A distância entre eles é pequena. Quanto mais se amam, muitas vezes não precisam nem falar, somente sussurram e ficam mais perto ainda do seu amor. Finalmente, com o amor maduro, seus corações estão unidos, como se fossem um só, e então não necessitam sequer sussurrar, somente se olham e sabem tudo o que se passa dentro do outro”.

“Por isso, quando discutirem, não deixem que os seus corações se afastem, não digam palavras duras e cruéis que os distanciem ainda mais, pois senão chegará o dia em que a distância será tanta que vocês não encontrarão mais o caminho de volta”.

Muitas vezes, nossa sociedade busca esta distância. A violência segrega os seres humanos, rompendo os laços afetivos, criando o medo entre iguais, aumentando as diferenças, atiçando os nossos instintos mais selvagens, gerando a competição, distanciando-nos da transcendência, da busca pelo sublime. Ceder a estes instintos é fácil, pois são sensações primárias. E se a violência for glorificada, a decorrência será a falta de sentido de vida ou ela mesma, a violência, tornar-se-á o sentido. A falta de sentido levará à incivilidade e à violência e os corações não mais se encontrarão em gestos de fraternidade e humanidade. Não permitamos a distância!



Ir. Deuceli Kwiatkowski

terça-feira, 4 de março de 2014

Ensinar é lançar sementes!

Interessante é perceber que a evolução humana se dá no contato com o outro. Mas para que isso aconteça é preciso construir memória formada a partir da repetição. A criança precisa repetir para assimilar. Quantas vezes repetimos às nossas crianças as mesmas palavras? “Estude! Não veja televisão tão de perto. Coloque um agasalho! Respeite seus avós. Seja um bom aluno!” etc, etc.

A repetição é necessária para o aprendizado, para a assimilação, para a compreensão, para a internalização. Não ter memória significa não reter conhecimento. E se não apreendermos, não há evolução. Seria como se cada ser humano voltasse à “estaca zero” sempre. Se não tivermos um conhecimento anterior, não seremos capazes de discernir entre o bem e o mal. Dessa forma, perderemos a consciência, voltaremos à ingenuidade, não infantil, mas ignorante.

Para educarmos um povo é preciso construir sua memória. Memória para cultivarmos valores éticos, humanos, cristãos que devem ser transmitidos às crianças e jovens e insistentemente relembrados aos adultos. Infelizmente esquecemos tão facilmente aquilo que exige mais de nós.

Mas o que é ser ético? É saber respeitar o outro. E o que é um valor? É algo que deve ter um conceito social. É preciso que o grupo o reconheça como tal. Quando se tem uma nota de 100 reais, por exemplo, não importa se está velha ou nova, amassada ou não, o seu valor será o mesmo. Da mesma maneira, o pudor, a bondade, a ética, a verdade, a dignidade e a honestidade são considerados bons valores e devem ser reconhecidos por todo um grupo da mesma forma e não só por parte deste grupo. O valor é para todos.

É possível que a solidariedade, a justiça, a dignidade, a lealdade, a generosidade e o respeito sejam valores ruins, ultrapassados, que não servem mais para os dias de hoje? Existem momentos em que devemos ser bons e outros em que devemos ser maus? Um valor não pode perder-se, não pode ser alterado, pois a essência de “ser valor” é a identidade com aquilo que ele é. Não há mudança. Um valor será valor sempre.

Dar valor é conhecer a verdade, entender as diferenças, discernir o bem e o mal, valorizar o que é útil para todos: a liberdade e a felicidade. O conhecimento da verdade tem que ser a ferramenta para a liberdade coletiva e não apenas para alguns.

E isso é exercer a verdadeira felicidade, pois apenas sou feliz quando abro possibilidade para a felicidade do outro. A minha liberdade ou a minha felicidade não acaba quando começa a do outro, mas termina quando acaba a do outro.

Conhecimento é transmissão. Os mais velhos são o húmus da terra. Eles a fertilizam. Quando ensinam, lançam sementes para os mais jovens. Vivamos assim!


Ir. Deuceli Kwiatkowski

sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

O "Sim de Maria ao plano de Deus" na fuga para o Egito.

Quem foi Maria?
Uma jovem escolhida por Deus desde toda a eternidade.
Quem foi Maria?
Uma jovem que respondeu Sim ao chamado de Deus.
Quem foi Maria?
Uma jovem pensada por Deus para ser a Mãe de seu filho Jesus e mãe de todos nós!

Bênção de Deus não sermos órfãos e termos uma mãe em quem podemos confiar!

Entre tantas viagens empreendidas por Maria, a “fuga da sagrada família para o Egito” (Mt 2,13-23), foi também uma viagem difícil, dura, iniciada às pressas para um país estranho, longe dos parentes, longe da Pátria, numa terra pagã, sem segurança alguma, em meio ao deserto.

Visivelmente era uma realidade de sofrimento, dor, tribulação, angústia vivida por Maria e José. Uma realidade que toca a todos nós! Não dá para fugir! O contato com a dor do outro me lembra que também sou humano porque o sofrimento é um destino inevitável, é fruto do processo que nos torna humanos. Se somos seres humanos, passaremos pela dor, faz parte! Não há outro caminho! Maiores ou menores, sempre teremos tribulações, sofrimentos, dificuldades. O grande desafio é saber identificar o sofrimento que vale a pena ser sofrido. Tantas vezes sofremos por besteiras e, por tão pouco, gastamos muitas energias com sofrimentos inúteis.

Esta viagem já tinha sido iniciada quando José e Maria partiram de Nazaré e foram a Belém por ocasião do recenseamento, nascimento de Jesus e agora para o Egito. Quanto tempo ficariam lá? O tempo necessário para que o Menino Jesus estivesse em segurança.

Nesta longa caminhada que durou muitos dias de viagem, pensemos nos desconfortos, nas carências materiais! Um bebê estava com eles, era recém-nascido e exigia muitos cuidados! O que comer, onde dormir, como lidar com o calor, com o frio?  Diz um autor que Se nas caminhadas empreendidas, Maria teve os pés fustigados pelo solo pedregoso, a caminho do Calvário era o seu coração que sangrava. Aos pés da cruz, (Jo 19, 25) cumpria o doloroso momento que lhe coube no Plano da Salvação, testemunhando o sacrifício do Filho Jesus Cristo, o Redentor dos homens”.  Não sabemos detalhes de como foi aquela dura viagem, mas sabemos que cada passo foi marcado pela confiança nas palavras do anjo a José. “Pega o menino e a mãe e vão para o Egito porque Herodes quer matá-lo”. Maria não questionou José, mas acolheu sua palavra como palavra do próprio Deus e pôs-se imediatamente a caminho; era necessário trilhar o caminho da confiança e da fé!

Fugir para salvar! Jesus estava em perigo! Tinha acabado de nascer e, desde tão pequeno, foi perseguido pelo orgulho, prepotência e ambição dos poderosos, por aqueles que não compreenderam que seu reino era um reino diferente, um Reino que nos ensinaria a chamar a Deus de Pai e a todos os outros de irmãos.

Maria, mulher que sofreu os golpes terríveis da vida, sentiu a dor daquelas mulheres das quais os filhos foram arrancados de seus braços com tamanha crueldade e mortos por causa do poder, do ódio, da ambição de Herodes.

Olhemos sempre para esta grande mulher: Maria! Ela sofreu com a coragem daqueles que têm fé! Era um sofrimento real, verdadeiro... a vida de Jesus estava em risco! Maria sofreu com a coragem daqueles que não ficam lamentando, choramingando, reclamando a própria sorte. Maria sofreu do jeito certo, do jeito que Deus quer, com fé, coragem, entrega à vontade de Deus! Olhemos para ela para aprendermos como viver e como sofrer, nem mais, nem menos, somente aquilo que Deus nos pede. Quando o Senhor nos pedir algo, tenhamos a coragem de responder-lhe com firmeza o nosso SIM! Ele não abandona quem a ele se confia, diz o salmista.

Como suportar tantas dores? Como permanecer de pé e firmes na fé quando as provações chegarem? Olhemos para Maria – mulher de fé! A fé é a certeza de uma grande Presença! Que presença é essa capaz de sustentar a vida, as decisões, as opções, as escolhas, dar força, coragem, determinação, serenidade? Maria viveu envolvida por uma Presença que a fazia meditar tudo em seu coração. Ela descobria no sofrimento, também um plano da vontade de Deus! Por isso, o percurso da fé é a confiança, a entrega, o abandono!

Mesmo que a tempestade seja densa na minha vida, mesmo que a noite fique escura, esta misteriosa Presença está perto! Está em mim! Eu sei em quem coloquei a minha confiança! disse Paulo.

Quanta confiança! Quanta coragem! Quanta fé Maria precisou ter para sustentar a esperança da humanidade! Do seu Sim, nasceu o Messias! Esta era a esperança maior, a promessa aguardada pelos povos em busca de libertação e paz.

Viver na fé não foi fácil para Maria e José! Ao dar o seu sim ao plano de Salvação, Maria aceitou um grande desafio: caminhar sem saber o que iria acontecer. De um sim maior, vieram todos os outros sins porque Deus foi se revelando, aos poucos, e Maria, entregue à vontade de Deus, deixou-se conduzir na confiança.

Maria! Quem é esta mulher que nos atrai tanto, nos deixa extasiados com tamanha força interior e não se cansa de levar seus filhos a Jesus?

Papa Francisco na sua Exortação Apostólica – Evangelii Gaudium - A Alegria do Evangelho – nos fala sobre Maria com especial predileção: “Maria é aquela que sabe transformar um curral de animais na casa de Jesus, com uns pobres paninhos e uma montanha de ternura. Ela é a serva humilde do Pai. É a amiga sempre solícita para que não falte o vinho na nossa vida... É aquela que tem o coração trespassado pela espada, que compreende todas as penas. Como mãe de todos, é sinal de esperança para os povos que sofrem as dores do parto até que germine a justiça. Ela é a missionária que se aproxima de nós, para nos acompanhar ao longo da vida, abrindo os corações à fé com o seu afeto materno. Como uma verdadeira Mãe, caminha conosco, luta conosco e aproxima-nos incessantemente do amor de Deus”.

São Francisco de Sales, admirável nas suas comparações, referindo-se à vara de Moisés, que se transformava em serpente quando no chão e voltava a ser vara na mão de Moisés, escreveu:

“Se olhais para a terra, a vara, de que se serviu Moisés diante do faraó, é terrível serpente, mas, se a vedes na mão de Moisés, é uma varinha com a qual ele opera prodígios. São assim as tribulações. Consideradas em si, na verdade, são horríveis e intoleráveis; consideradas na mão de Deus, são amáveis e deliciosas”. Nas mãos de Moisés, a vara não fez tantos prodígios? Acostumemo-nos a olhar as adversidades com mais espírito de fé, nunca isoladas, separadas da Mão de Deus. Na mão de Deus, a vara das tribulações é vara e nada mais. Não assusta, e é capaz de abrir o rochedo de nossos corações para fazer brotar neles fontes de graças e lágrimas suaves e redentoras da contrição. Fora nos deixa amedrontados porque é a serpente venenosa.

Que o Senhor não permita que nós consideremos os nossos sofrimentos deste mundo fora das suas mãos. Que o Senhor nos livre da serpente venenosa e que os nossos sofrimentos estejam em suas mãos.

Papa Francisco diz: “A dor não é uma virtude em si mesma, mas pode ser virtuoso o modo como é assumida. Nossa vocação é a plenitude e a felicidade, e, nessa busca, a dor é um limite. Por isso, entendemos em plenitude o sentido da dor por meio da dor de Deus feito homem”.

O que aconteceria se Deus não tivesse assumido a forma humana, ou seja, se Deus não tivesse vindo ao mundo dar sentido ao nosso caminho? À nossa existência? À nossa dor? Às nossas viagens?

“Por isso, o segredo passa por entender o sofrimento como semente de ressurreição. Toda tentativa de superar a dor dará resultados parciais se não for fundamentada na transcendência. É um dom de Deus poder entender e viver a dor em plenitude. Mais ainda: viver em plenitude é um presente”, afirma Papa Francisco.

À jovem Bernadete, em Lourdes, Nossa Senhora disse: “Não te prometo felicidade aqui na terra, mas a felicidade no céu!”


Ir. Deuceli Kwiatkowski

domingo, 26 de janeiro de 2014

A quem pertencemos? A Deus ou ao mundo?


Existe força e poder nas palavras! Não temos dúvida disso.

Elas chegam com uma força incrível e nos apontam novos caminhos, nos dão esperança, criam em nós novas certezas, possibilitam novas reflexões, alargam nossa mente, nos fazem sorrir, nos dão asas pra voar alto. Mas não vivemos apenas da palavra que nos leva para o alto. Existem palavras que deixam em nós o gosto amargo da decepção, da desilusão, da incompreensão, da desarmonia, da inquietude. Conviver com estas palavras torna-se uma luta. O tempo e energia que consumimos tentando manter o equilíbrio e evitando ser abatidos e naufragar mostra que nossa vida é uma luta pela sobrevivência.

Eis então a questão: A quem pertencemos? A Deus ou ao mundo?

Muitas preocupações diárias sugerem que pertencemos mais ao mundo do que a Deus. Qualquer crítica nos deixa abatidos, desmotivados, zangados e a menor rejeição nos deprime. O menor elogio levanta nosso espírito, um pequenino sucesso nos anima. Bem pouco é necessário para nos levantar ou deixar pra baixo. Frequentemente somos como uma embarcação num oceano, completamente ao sabor dos ventos e das ondas. Uma verdadeira batalha que resulta, muitas vezes, da ideia errada de que é o mundo que dá os nossos parâmetros.

Por isso vale pensar: Quanto mais nos distanciamos do lugar onde Deus habita, tanto mais incapazes nos sentimos de ouvir a sua voz. Quanto menos ouvimos esta voz, mais vulneráveis ficamos na manipulação e nas tramas do poder do mundo.  

Longe do tronco, somos como folhas secas, sem vida. Longe da luz, tudo se torna sombrio. O coração se torna pesado, o corpo cheio de tristeza, a vida perde o rumo certo, sentimo-nos perdidos. “Decadência” pode ser a melhor palavra para explicar o vazio que tão profundamente permeia nossa sociedade.

Nossos hábitos desregrados criam em nós expectativas que só podem deixar de satisfazer nossas verdadeiras necessidades. Enquanto cultuamos os valores pregados pelo mundo, poder, fama, consumismo etc, acabamos por aceitar empreender uma viagem para um “país distante” como o Filho Pródigo. Nesta viagem, defrontamo-nos com desilusões sem fim e com um vazio que só pode ser preenchido quando decidirmos encontrar o caminho de volta e retornarmos para a casa do Pai.  

Não permitamos que o mundo nos tire a fé nem a esperança. Se não tivermos fé, viveremos condenados a uma eterna dúvida e o naufrágio será nosso destino final.


Ir. Deuceli Kwiatkowski