sexta-feira, 11 de abril de 2014

Colocar o coração junto ao coração do outro

Ao longo da história sempre existiram homens e mulheres que fugiram da superficialidade das respostas fáceis e buscaram na reflexão profunda, respostas para muitos questionamentos. Foram capazes de olhar para o mundo, para si mesmas, para as pessoas de um jeito diferente tentando descobrir o essencial. Formamos um único organismo e o que toca o outro, me toca sempre. Clarice Lispector dizia: “Eu escrevo como se fosse para salvar a vida de alguém, provavelmente a minha própria vida”.

Durkheim, citando Weber, fala de um ser humano que se sente num mundo “desencantado”, onde o individualismo chegou ao extremo. Devemos ter cuidado com isso, pois é o desmoronamento da capacidade de vida coletiva que gera a crise ética. Isso ocorre quando não há concordância entre os seres humanos, visto que a expressão ‘cum cor’ é colocar o coração junto. 

Para compreendermos melhor o significado dessa expressão, relembrarei uma historinha que se aplica bem a este conceito de concordar, ou seja ‘colocar o próprio coração junto ao coração do outro’.

Um dia um Mestre perguntou aos seus discípulos:  “Por que as pessoas gritam quando estão aborrecidas? Os discípulos pensaram por alguns momentos e responderam: “Porque perdem a calma, porque se irritam”.“Mas, por que gritar quando a outra pessoa está ao seu lado, próxima a você? Não é possível falar-lhe em voz baixa?” – continuou o mestre.

Os discípulos justificaram-se respondendo que, às vezes, as pessoas ficam impacientes, ou porque não se fazem entender, ou porque estão incomodadas com algo, e então gritam para ver se o outro a compreende. Vendo que eles não chegavam ao âmago da questão, o mestre lhes explicou:

As pessoas gritam porque quando elas estão aborrecidas, seus corações se afastam. E para cobrir esta distância precisam gritar para uma escutar a outra. Quanto mais aborrecidas estiverem, mais alto e forte têm de gritar para serem ouvidas”.

Para fazer-se entender ainda mais, o mestre continuou:  O que sucede quando duas pessoas se enamoram? Elas não gritam, falam suavemente. Por quê? Porque os seus corações estão muito perto. A distância entre eles é pequena. Quanto mais se amam, muitas vezes não precisam nem falar, somente sussurram e ficam mais perto ainda do seu amor. Finalmente, com o amor maduro, seus corações estão unidos, como se fossem um só, e então não necessitam sequer sussurrar, somente se olham e sabem tudo o que se passa dentro do outro”.

“Por isso, quando discutirem, não deixem que os seus corações se afastem, não digam palavras duras e cruéis que os distanciem ainda mais, pois senão chegará o dia em que a distância será tanta que vocês não encontrarão mais o caminho de volta”.

Muitas vezes, nossa sociedade busca esta distância. A violência segrega os seres humanos, rompendo os laços afetivos, criando o medo entre iguais, aumentando as diferenças, atiçando os nossos instintos mais selvagens, gerando a competição, distanciando-nos da transcendência, da busca pelo sublime. Ceder a estes instintos é fácil, pois são sensações primárias. E se a violência for glorificada, a decorrência será a falta de sentido de vida ou ela mesma, a violência, tornar-se-á o sentido. A falta de sentido levará à incivilidade e à violência e os corações não mais se encontrarão em gestos de fraternidade e humanidade. Não permitamos a distância!



Ir. Deuceli Kwiatkowski

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